quarta-feira, 23 de julho de 2014

Ariano Suassuna por Cleyde Yaconis

É tão bonito o trecho em que Cleyde Yaconis fala de Ariano Suassuna em A Dama Discreta, que tive o prazer de escrever. Enquanto copiava, me veio na voz dela. Taí. Pra Ariano Suassuna. 


Fredi Kleeman, Cleyde Yáconis, Walmor Chagas e Cacilda Becker: O Santo e a Porca
“Uma das boas lembranças das época da Companhia Cacilda Becker é meu conhecimento com Ariano Suassuna, de quem montamos duas peças O Santo e a Porca e O Auto da Compadecida. Os personagens de Ariano são maravilhosos, brasileiros, têm o humor, a malícia e a safadeza do povo brasileiro, como ele se vira e se sustenta. Fiz um palhaço do Auto e a Caroba do Santo e a Porca, que foi a peça de lançamento do Teatro Cacilda Becker, em março de 1958, no Teatro Dulcina, no Rio. Ariano adorou a montagem e eu ganhei o Prêmio Governador do Estado de melhor atriz. Peça de estreia da Companhia em Lisboa, o Auto era dirigido pela Cacilda.

Quando a Companhia passou por Recife, rumo à excursão pela Europa, fui almoçar na casa do Ariano e ficamos amigos. Lembro que a casa dele tinha um muro amarelo, cheio de pinha e ele arrancou uma pinha do muro e me deu.*


Adoro O Santo e a Porca e, no começo dos anos 70, produzi uma remontagem da peça que fez bastante sucesso e chegamos a apresentar na Penitenciária de Bangu, no Rio, mas não trabalhei como atriz. Três anos atrás, o Ariano Suassuna foi homenageado por uma escola de samba, ele me telefonou e falou que fazia questão que eu fosse. Eu disse “Te adoro, mas não tanto”. Carnaval nem pensar. Só gosto porque são quatro dias e, quando eu estou trabalhando, fico de folga na minha casa.”

*Ah, a pinha que ela fala sempre esteve na varanda da casa de Jordanésia.

quinta-feira, 17 de julho de 2014

No Brasil tudo está bem se um sujeito é simpático

Implico com simpatia, com a obrigação de tem de ser. E nem vou citar exemplos, mas canso de ouvir “Ah, fulano não é simpático, sicrana é uma simpatia” e simplesmente esquecem de algo que se chama falsa simpatia ou simpatia profissional. Bom, isso pra falar de um texto que encontrei mexendo em livros. Tenho a mania de anotar a lápis na última página sobre certos assuntos que me chamam atenção. Em O Senhor Embaixador, de Erico Verissimo, estava escroto: “386 – Brasil”. Havia lido esse livro em julho de 1993 (tá anotado lá também) e claro que não lembro da história e, muito menos, do que significaria a anotação “Brasil”. Fui à página marcada e me deparei com uma visão sobre o país e os brasileiros. É bom lembrar que O Senhor Embaixador saiu em 1965, muita água rolou desde então, mas o poder de fogo do texto do Erico Verissimo continua. Tem muito do que penso sobre simpatia e vou copiar aqui esse trecho. É uma fala do personagem Gonzaga com Clare, logo após um escândalo sobre uma grande compra de feijão podre. Em dia de “humor negro” e já meio “alto”, Gonzaga é implacável:


- Feijão podre! Um símbolo de nosso regime, da podridão de nossos governantes e políticos. O Brasil, Clare, é um país saqueado. De fora para dentro. De dentro para fora. De cima para baixo... Ninguém nunca é responsabilizado por coisa alguma. Ninguém vai para a cadeia. Ó não! Somos encantadores, temos corações de ouro maciço! Inventamos as anedotas mais engraçadas do mundo. Achamos que todos devem nos adorar, pois não somos hospitaleiros e bons causeurs? Fazemos troça de todos, inclusive de nós mesmos. Temos remédios infalíveis para os males de todos os países, menos para os do nosso. A simpatia no Brasil é a grande panaceia. E é nessa simpatia, Clare, nesse bom-mocismo (que torna o convívio com o brasileiro individualmente tão agradável), que reside nossa desgraça como nação! No Brasil tudo está bem se um sujeito é simpático. Por simpáticos (e também irresponsáveis e levianos) esperamos que as coisas nos caiam do céu, Por simpatia votamos em homens incompetentes e ou desonestos para os cargos públicos. Se somos governantes ou políticos, por simpatia dizemos sim a tudo o que nos pedem, emborar depois não cumpramos o prometido. Por simpáticos damos empregos ou concessões rendosas (nem sempre lícitas) a parentes, amigos, compadres, afilhados, protegidos... e, que diabo!, por simpáticos fazemos as maiores concessões a nós mesmos, e satisfazemos a todos os nossos apetites. E essa nossa simpatia, sinal, repito, dum coração de açúcar, nos impede de fazer cumprir a lei, de sorte que bandidos e ladrões andam às soltas e podem ser senadores, deputados, governadores e até Presidentes da República. Por simpáticos achamos que todos devem ajudar sem nunca nos pedir contas de nada. Por simpáticos (ah! E por inteligentes, espertos e mestres na arte da improvisação) não planejamos nada, produzimos pouco, gastamos o que não podemos, e confiamos sempre nas soluções mágicas. Porque no Brasil se acredita que até o deus ex machina é brasileiro. Ah, Clare! Como somos simpáticos! Você já tinha notado isso, não? Pois é. Somos tão simpáticos que nos acostumamos à miséria em que vivem mais de dois terços da população total do país... uma miséria abjeta que, no nosso Nordeste, é igual ou pior que a asiática... E como somos simpáticos e caridosos e, às vezes, vamos aos domingos à missa, durante a qual sorrimos e acenamos de longe para Deus (que deve ser um sujeito simpático) de vez em quando damos esmolas aos mendigos, vagamente convencidos de que assim estamos contribuindo para resolver o problema social...

segunda-feira, 7 de julho de 2014

García Marquez, Hélio Pellegrino e o cocô

Os livros na estante, mexer neles, pegá-los ao acaso, folheá-los: Eis algo que me traz muito prazer e “redescobertas”. Abaixo uma delas, um trecho da bio de Hélio Pelegrino na série Perfis do Rio, escrita por Paulo Roberto Pires.

“Menos emocionado e infinitamente mais inusitado foi o encontro entre Hélio e Gabriel García Marquez, que então dava os últimos retoques em O amor nos tempos do cólera e também fora a Cuba para uma reunião de intelectuais com o líder cubano. Durante horas, ambos travam um diálogo inacreditável, transcrito por frei Betto em O paraíso perdido:

- Os homens se dividem entre os que cagam bem e os que cagam mal – disse Gabo, confessando-se estar incluído entre os segundos e ter inveja dos primeiros.

- É isso mesmo – animou-se Hélio, que não iria perder a chance de criar uma tese. – O sujeito, ao sentar na privada, entra em contato com aquilo que é mais abjeto em sua intimidade, a excrescência repelida pelo organismo e seu odor fétido. Há quem retenha as fezes como se temesse perder parte de si mesmo. Neste caso, o sujeito caga como quem sofre uma cirurgia, sofrendo que as vísceras lhe escapem por baixo.

- Eu gostaria de cagar na hora certa, como os europeus que se levantam da mesa do café e se dirigem à privada – diz o escritor.

- Alguém deveria fazer um estudo comparativo sobre a consistência do cocô. Há bostas piramidais, bostas compridas como a dos cães, bostas aguadas e disformes, como quem está sempre de caganeira – prossegue Hélio numa conversa infindável”.



Quer seguir no assunto? No link abaixo, a classificação do cocô segundo Vinicius de Moraes e Ronaldo Bôscoli

Quem quer brincar de boneca? Texto de Vange Leonel

O filme Barbie está por todo lado. E de tanto ouvir falar em boneca, me lembrei de um texto de Vange Leonel sobre elas e fui até grrrls - Ga...