Quem me conhece ou já conversou cinco minutos comigo sabe: existe uma maravilha chamada Ava em minha vida. É uma montanha de pelos, pretos por todo lado e brancos apenas nas quatro patinhas, bigode e peito. São 11 anos de intenso convívio, uma relação perfeita, com raríssimas rusgas. Aquela cara sempre séria onde reinam dois olhos de um verde profundo, está sempre ali e atenta a tudo que acontece comigo e se estou triste, a atenção é redobrada. E de vez em quando até brincamos de piscar.
Dizem que os animais não têm inteligência. Dizem, né, dizem tanta coisa. Eu questiono o que seja inteligência e pra que ela serve. Ava e eu não falamos a mesma língua. Ela entende meu “humanês” perfeitamente, não o fala talvez por timidez ou pra não me intimidar e até desenvolveu um “miadês” pra se comunicar comigo. É todo um alfabeto de diferenciados miados, cada um com seu significado, alguns se assemelham a pios, outros são longos, repetitivos, insistentes, quase lamentos.
Quando bate a fome, utiliza praticamente uma sinfonia miaus pra que a leve até seu prato, localizado estrategicamente na área de serviço. É um dos caprichos da preta. Ali, entre um e outro grão de ração, me olha feliz e solta os mais doces e incríveis ronronados – e ronronados, quem é propridade de um gato sabe, é sonido que representa prazer total não que eles transmitem asma, como muito ignorante costuma propagar. Quando estou mais paciente, fico ali vendo Ava se banquetar e atento aos ronronados, misturando ao som da ração sendo triturada por aqueles dentes afiados.
Ah, Ava veio das ruas, está longe de fazer o tipo gatinha dócil, tem temperamento forte e indomável e seu nome é homenagem a Ava Gardner, a diva de Hollywood que Jean Cocteau elogiou como “o animal mais lindo do mundo”. Monsieur Cocteau estava certo, e muitas vezes me divirto a imaginar o que ele diria se conhecesse essa montanha de pelos que mora aqui em casa.