Seurat |
Abaixo, um trecho de À
Sombra das Raparigas em Flor, o segundo livro de Em Busca do Tempo Perdido, de
Marcel Proust. Inteligência, vontade e sensibilidade são protagonistas e a
tradução é de Mario Quintana. A partir do final desse parágrafo, é tudo do Proust, na
tradução gloriosa de Mario Quintana.
“(...) Minha inteligência
considerava esse prazer muito pouco valioso logo que o teve assegurado. Mas em
mim a vontade não participou um único instante dessa ilusão, porque a vontade é
a serva perseverante e imutável de nossas personalidades sucessivas; oculta-se
na sombra, desdenhada, incansavelmente fiel, e trabalha sem cessar e sem se
preocupar com as variações de nosso eu, para que não lhe falte nada do que
necessita. No momento de efetuar uma ansiada viagem, no momento em que a
inteligência e a sensibilidade começam a se perguntar se realmente valerá a
pena viajar, a vontade, sabedora de que essas duas amas ociosas considerariam
outra vez tal viagem como uma coisa magnífica desde que não se efetuasse,
deixa-as divagar diante da estação e entregarem-se a múltiplas hesitações; e
vai tomando as passagens e coloca-nos no vagão para quando chegue a hora da
partida. Tudo quanto têm de mutáveis a sensibilidade e a inteligência, tem-no
ela de firme; mas como é calada e não expõe seus motivos, quase parece que não
existe, e as partes restantes do nosso eu obedecem às decisões da vontade sem
dar-se por isso, ao passo que por outro lado percebem muito bem as suas
próprias incertezas. (...) “
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