terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Um conto natalino pouco conhecido de Jorge Amado


Graciliano Ramos e Mario de Andrade
Erico Verissimo
Fiquei maluco quando topei com uma edição de Natal da revista O Cruzeiro de 1939. Lá estavam contos de Graciliano Ramos, Mario de Andrade, Jorge Amado e Erico Verissimo. Atribulações de Papai Noel e Briga das Pastoras, os de Graciliano e Mario, frequentaram livros. Os de Jorge e Erico, duas joias, não e pareciam confinados lá à espera de leitores. Noite de Natal em Porto Alegre, o de Erico, foi publicado no domingo anterior ao Natal na Zero Hora, jornal de Porto Alegre (Aqui o link https://t.co/sOdPFCvvYS). Visita ao Presépio de Quinquina, o de Jorge Amado, é bem pouco conhecido. Enviei pra Josélia Aguiar que escreve uma biografia do autor baiano e ela confirmou isso. Jorge tinha 27 anos e fugindo da perseguição do Estado Novo de Getúlio Vargas refugiou-se em Estancia (Sergipe), que é o cenário do conto. E Quinquina, vinte anos depois, vira personagem de Gabriela – o presépio também. O Natal já passou, mas os presépios ainda não foram desmontados e ainda há tempo de visitar Estancia e o Presépio da Quinquina. Abaixo o conto. 



             Visita ao Presépio da Quinquina
                                                               
                                       Jorge Amado



Ora, quem sabe se um dia os fados não vos levarão a entrar num trenzinho da Leste Brasileira que, com um atraso médio de nove horas, vos deixará em Salgado, vila perdida de Sergipe? E quem sabe se esses fados não continuarão a brincar com o vosso destino fazendo com que aí embarqueis num auto ou num ônibus em direção à cidade de Estancia? Se assim for, abençoarei os fados, porque terão sido bons fados. Estância será para vós uma bela surpresa e se não estais com o coração de todo murcho amareis com certeza esta cidade lírica e jovial, cercados pelos rios e penetrada por um bosque. Vos sentireis românticos e poetas andando nas ruas largas de Estancia, olhando os velhos casarões de balcões floridos e vendo a boa gente que atravessa as ruas num passo sem pressa. Vossos olhos contemplarão velhas centenárias que sabem histórias de outros tempos, histórias de um sabor inesquecível, e verão também o maravilhoso espetáculo da noite de Estancia, bela sobre todas, noite na qual sobram as estrelas e o luar. Vereis a lua mais inspiradora e as mais brilhantes estrelas. Muita coisa mais vereis também se descerdes ao cais, onde as palmeiras e as canoas olham o mar distante e o rio próximo.

Mas se os fados de tão bons forem a fada da bondade e vos levaram a Estancia no Natal, então, ó viajante, cruzai a rua Capitão Salomão, penetrai no Parque Triste e, ao primeiro estanciano que encontrardes, perguntai onde fica a casa da minha prima Quinquina. Ele vos indicará com a gentileza que caracteriza o filho desta cidade. Marchai então para lá e marchai sem receio. Não é preciso sequer que digais o vosso nome. Na porta encontrareis uma das irmãs e basta anunciar que quereis ver o presépio. Antes com certeza vos farão entrar na sala de jantar onde pedirão que, entre diversos licores, decidais daquele que querereis beber. Será sem dúvida uma escolha difícil porque sobre a mesa encontrareis licor de jenipapo, talvez com mais de três anos de engarrafado, licor de mangoba que é tão fino como o mais fino licor francês, licor de banana que contém vitamina e muitos outros mais. Porém se quereis um bom conselho provai primeiro o licor de abacaxi. Ele é feito por Géo e duvido que sobre a face da terra, alguém saiba fazer um licor de abacaxi como a minha prima Géo. Ao meu ver é uma das glórias da família esse licor de abacaxi. Provai, porque depois provareis de todos os demais e, se não sois totalmente cretino, dareis estalos com a língua, estalos que porão rosadas de alegria as faces de Géo. Com certeza encontrareis doces e bolos também e vos aconselho que aceiteis porque por isso não só comereis de um prato gostoso como deixareis radiante de felicidade a minha prima Quinquina que faz os doces. E assim, de estômago satisfeito, elas vos levarão, humildes e se desculpando, a ver o presépio.

Antes era a sala de visitas. Essa sala de visitas que se abre exclusivamente nas grandes ocasiões, quando a visita é de muita importância. Agora ela desapareceu, o presépio domina tudo. Reparai bem que o presépio é uma multidão mas não é uma confusão. Ao primeiro momento pode vos parecer que as figuras recortadas do Tico-tico e pregadas sobre papelão estejam misturadas com os burros e os bois de barro que são vendidos nas feiras do nordeste. Que as estampas religiosas (Santa Rosa de Lima, que é a santa dos olhos e da luz, e São Benedito, que é preto) estejam profanamente próximos dessas estampas recortadas de revista mundana e que são homens e mulheres elegantes, todos nas ruas de areia e conchas que levam à manjedoura. Mas não há tal mistura se atentardes bem no presépio. Observareis que vários são os planos dessa cidade em miniatura que minha prima Quinquina constrói todos os anos na sua sala de visita. E os santos estão num plano mais alto, os burrinhos e os bois num plano mais baixo como num terceiro estão os homens e mulheres e o pastor com seu rebanho de carneiros brancos. São muitas as ruas também, rua calçada de areia que veio de Mangue Seco e nas quais as conchas brancas e cor de rosa semelham calhaós enormes. São as ruas de Bethlem, onde nasceu o Cristo. Vós não sabeis bem como eram as ruas de Bethlem, eu não o sei tão pouco. Só um velho historiador, desses que passam a vida sobre antigos papéis, poderia dizer como eram de fato as ruas da cidade que assistiu ao nascimento do Menino. Mas um historiador velho, dobrado sobre os documentos, é um homem que já perdeu toda a poesia da vida e a sua descrição seria seca e triste, desinteressante e por tudo isso falta de verdade. Porém minha prima Quinquina sabe perfeitamente como eram as ruas de Bethlem. Sabe que eram pobres porque foi principalmente para os pobres que o Cristo veio. Sabe que eram em vários planos, enladeiradas e cheias de calhaós porque a vida de Cristo não foi suave e ele amava as ladeiras e as montanhas. Sabe que havia cisternas porque o Cristo amava também a água, símbolo de toda a pureza. Sabe que os rebanhos andavam nas ruas porque sabe que o Cristo era toda bondade e amava igualmente aos animais. Sabe que havia uma confusão de gente, santos e pecadores, mendigos e elegantes, crianças e mulheres, porque Cristo amou a todos, sem distinção. Os demais perderam a visão da cidade de Bethlem, não sabem das suas ruas nem da gente que nelas estava, porque perderam a visão do Cristo ou a quiseram adaptar a si. Mas minha prima Quinquina sabe que o Cristo foi bom e foi bom para todos, sem distinção de classes e mesmo sem distinção sobre a virtude e o pecado. Sabe que o Cristo foi humano também e ela não esqueceu essa lição de humanidade. Ela não leu os teólogos, os tomistas, os neo-tomistas e guardou a visão perfeita do Cristo: a suma bondade, a suma humanidade. Por isso é essa multidão que parece confusão no meio das lâmpadas pequenas que iluminam a cidade e a manjedoura. Por isso vão bois de mistura com crianças, burros ao lado das mulheres e homens pecadores ao lado dos santos. E se caíssem uns livros ilustrados na mão da minha prima, ela não teria receio de por Voltaire, Nero, Robespierre, Marat e Calígula, todos os que foram e são na Terra inimigos do Cristo, porque sabe que o Menino os receberia com o mesmo olhar sereno, e como esses inimigos são muito diversos entre si, ele sorriria para aqueles que só combatem a caricatura que dele fizeram os homens e abrandaria com o olhar os que odeiam a sua verdadeira figura. E seu olhar suavizaria uns e outros corações.

Descansai os olhos na manjedoura onde o Menino dorme, cercado pela Virgem, por São José, os Reis e os animais. Não deveis vos importar se há desproporção entre as figuras, se o Menino é maior que todos porque em verdade o era e isso também minha prima Quinquina adivinhou porque na sua pobreza e na sua bondade ela sabe tudo que se refere ao Cristo, sobre todos bom e sobre todos pobre.

Viajantes cansados dos Natais das grandes cidades com presentes caros e champagne: ide a Estancia e no Parque Triste encontrareis o presépio de Quinquina. Bebereis licor, comereis bolo de aipim, conversareis com as velhas. E na sala de visitas encontrareis, pobre e nu, cercado, no entanto, de Reis, santos, homens, mulheres e animais, Cristo, o verdadeiro, o que perdoou Madalena, lavou os pés dos mendigos e pescou com os pescadores nas águas do Jordão.

                                             O Cruzeiro, 23 de dezembro de 1939



segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Castelinho do amor, adeus


Dois andares, bem simplinha e discreta a casa. O embranquiçado encardido sinalizava a decadência também visível na vizinhança de galpões e outras mal tratadas residências de dois andares. Do outro lado da rua, a uns 50 metros, um concorrido ponto de ônibus e do lado dele um motel com jeito daqueles de beira de estrada. Só com muita boa vontade podia se imaginar um castelo ali. No pequeno neon na entrada um “bem-vindo” emoldurado num daqueles sorrisos com jeito de emoticon e o nome do estabelecimento Castelinho do Amor pra não deixar dúvidas de que de um puteiro se tratava. E barato, bastava olhar pra perceber, local para programas rápidos.
Aqui funcionou o Castelinho do amor

Passava ali quase todo dia – horário do almoço ou começo da noite – e raras vezes vi sinais de vida no planeta castelinho. Nem som de música, nem muitas luzes. Tudo discreto e mais pro escuro. Ao lado, uma pequena lanchonete e muito raramente alguma moça que parecia labutar ali: sem muito trato na aparência, chinelos de dedos nos pés, shorts mas não shorts cu de fora.


Certo dia, de surpresa, encontrei o Castelinho do Amor fechado. Percebi que o neon sorriso bem vindo mudara para uma casa cor de carmim na esquina, mas o nome “castelinho do amor” não. Foram alguns meses de sinais de abandono maiores a cada dia até o corte final: a casa estava no chão e sinal dela só nas paredes laterais das residências vizinhas. Faz algum tempo da demolição e até um muro surgiu e foi grafitado. Do lado direito, mais duas casas, e depois um muro imenso, do mesmo material, esconde o terreno enorme de novo empreendimento comercial/residencial na valorizada região. Não existe mais espaço para Castelinho de amor em SP. 

terça-feira, 27 de outubro de 2015

Simone de Beauvoir por Cleyde Yaconis


Simone de Beavouir está de volta - santo Enem - e lembrei de A Cerimônia do Adeus, peça do finalzinho dos anos 80, em que Cleyde Yaconis a interpretava. Foi a primeira vez que vi a grande atriz em cena. Abri Dama Discreta, livro sobre Cleyde que tive a honra de escrever, e a parte em que ela fala de Simone é tāo deliciosa, mas tāo deliciosa, que vou copiar aqui, ouvindo a voz de Cleyde, as pausas...

Cleyde Yaconis, Antonio Abujamra, Marcos Frota
"A Cerimônia do Adeus, que fiz em 1989, foi a melhor peça do Mauro Rasi e um encontro prazeroso com uma mulher extraordinária, a Simone de Beauvoir. O papel era pequeno, como texto, como aparição. Era uma personagem fantástica. O Marcos Frota fazia o menino de 16 anos apaixonado por aquela mulher fascinante.

Eu fiz toda a pesquisa de Simone de Beauvoir, chorei de rir porque era extraordinária aquela mulher. A minha entrada em cena chamava atençāo. Eu entrava andando reto, marcial e tirei isso de umas fitas a que assisti com horas de imagens dela. Era uma entrevista e ela estava sempre com as mãos cerradas, não abria as mãos uma única vez, e acabei incorporando essa característica dela na peça. Peguei a Simone de Beauvoir na fase dos 40 anos, porque se um adolescente se apaixona daquele jeito tem que ser uma mulher de 40. Outras pessoas fazem a peça e pegam a Simone com 60. Não é possível. Um menino lindo se apaixona por uma mulher experiente, que é depois dos 30.


O Sartre viajava de carro e de trem, ela ia a pé, andava dez, vinte quilômetros e dormia na estrada. Quando ela se apaixonou por um americano, pegava o avião em Paris e ia para Nova York só para se encontrar com ele e voltava. Era independente, livre, mulher, audaciosa. Então foi um prazer, mesmo num papel pequeno, transmitir o que era essa mulher do Sartre, que era preguiçoso, mole, moleirão. E ela dinâmica e fantástica. Depois eu achei muito engraçado, porque ela nunca morou com o Sartre, eles moravam separados. Com o último amante, a última paixão, ela caiu em contradição. O último, ela levou para morar com ela. Ela já com 60, e o amado, jovem."

Aqui dá pra ler Dama Discreta (Coleção Aplauso) inteiro e sem custos

terça-feira, 29 de setembro de 2015

Pepe, El Guia: raridades de Clarice Lispector

Em 1947, Clarice Lispector morava em Berna e foi com o marido para a Espanha. Nesta crônica, publicada em O Cruzeiro, no começo de 1950 quando passou um período no Brasil, ela escreve sobre a viagem a partir das lembranças de Pepe, o guia que os acompanhou em Córdoba. Foi publicada com o título de Um Homem Espanhol na primeira edição de A  Legião Estrangeira (1964),, numa parte de escritos curtos chamada Fundo da Gaveta. 

                                          Pepe, el Guia

Não era Pepe apenas, não era guia apenas. No calor do verão, o rosto entumescido por um álcool que mal se evaporava era substituído por outro, o homem parou numa ruela branca e sombria de Córdoba, olhou-nos e disse lento:

- Ustedes no tienen un guia. Ustedes tienen Pepe el Guia!

Paramos emocionados diante do que deveria ser uma coincidência singular. Qual? apenas uma coincidência. Pepe el Guia imobilizara-se com os olhos úmidos de emoção, de vinho, de calor e de desespero. Devia ser extraordinário e pesado ser – Pepe el Guia! Ainda parado, o rosto escorrendo suor, a infalível roupa escura da elegância – mais um momento e tornar-se-ia extraordinário não só ser Pepe el Guia como uma pessoa ser ela mesma, como ser espanhol entre tantas possibilidades, estar sob o alto céu azul de Córdoba quando também existe Londres, e Córdoba existir neste mundo: o milagre passou por nós em fraca brisa. Em torno, a cidade se estendia doce e quente, insuportavelmente doce, cheia de cegos indecisos e de mulheres mais indecisas ainda. Havia no entanto uma aspereza. Aonde estaria? talvez nos sonhos destemidos dos homens que sonolentavam às portas dos cafés, talvez nessa vontade de escapar que se adivinhava, como uma emboscada, na calmaria. Cidade perigosa, esta. E no meio da devastação do calor, no meio da estranheza, erguia-se o nosso homem, embriagado com sua própria altura: soy Pepe el Guia! repetiu de braços abertos. Como se este personagem fosse uma abstração preexistente, e um homem, um simples pepe, um simples guia, neste símbolo se tivesse encarnado. Diante de nossa mudez e de nosso respeito, confortou-nos: “pero ustedes tienen un amigo en Pepe el Guia”!

Mas por que dizê-lo com tristeza? Triste, valoroso, bêbado, a dominar melancolicamente castelos que só ele, e por um instante de graça, nós viamos nas casas baixas de Córdoba. Era um amigo, sim. Amizade de um momento, amizade paga, mas com todo o desespero da amizade: éramos amigos e, no entanto, que poderíamos dar um ao outro? Senão reconhecermo-nos.

Nós reconhecíamos nele Pepe el Guia, e ele em nós – aqueles que o reconheciam.

E que amigo sensível. Uma palavra descuidada ofendia-o, um gesto apenas esboçado de dúvida o feria – imediatamente recuava, dando espaço ao desembainhar da espada. Humildes e apressados, explicávamos a nossa pouca vontade de ofendê-lo, assegurávamos nossa confiança absoluta na sua sabedoria de vagas datas, onde histórias de mouros antigos se entrecruzavam com a de turistas ingleses, “amigos seus para sempre”. Dom Pepe examinava as desculpas antes de aceitá-las, hesitava longamente, ainda ameaçador. Nós aguardávamos ansiosos e na verdade bastante enojados. Afinal, num repente, reconciliava-se e prosseguia, ainda mais ardente na amizade fortificada.
Verdade é que de Córdoba soubemos pouco mais do que sabíamos, soubemos das noites cheirando a nardo e a jasmin, soubemos o que víamos e o que pressentíamos. Mas de Dom Pepe, sim, soubemos que não havia alma viva em Córdoba: Córdoba non: España! – que não o conhecesse e louvasse. España só? Não. Marrocos, Argel, Egito... Os estranhos comércios que este homem já fizera, trocando cavalos decerto alheios, comprando tâmaras e azeitonas – comércio da antiguidade, mais aventura que comércio, mais viagem que proveito, mais vida que dinheiro. E a família de Pepe? Não era somente a família que sua força havia criado e com que abundância, era também a família de seu irmão morto na guerra civil, era também a família de seu cunhado morto na Guerra Civil. Quem diz família diga três tribos que a sua generosa irresponsabilidade abrigava. E quem lê família que veja bando de mulheres curtas e doces abanando-se no pátio com os olhos entrefechados, que veja meninos e rapazes paralisados para o trabalho pela esperança de tourear, ou pela esperança: que veja as grandes comidas que são necessárias para alimentar tantos sonhos.

O que não impede que Dom Pepe por um triz não puxe a espada quando tentamos pagar um xerez especial que só Pepe el Guia conhece e oferece. Ofendido na sua raça, trêmulo no hábito secular da indignação – Ustedes me matan!

Pagamos o xerez, agradecemos-lhe a oportunidade de conhecer bebida tão rara que em qualquer botequim espanhol servem. Nosso amigo, ainda emocionado com o drama de uma amizade quase desfeita, em sinal de perdão e magnanimidade, diz que aceita mais dois “copitos” que, para a nossa confusão e vergonha, havíamos esquecido de lhe oferecer.

Revista O Cruzeiro, 18 de fevereiro de 1950



sexta-feira, 31 de julho de 2015

Cleyde Yaconis e o terror policial no teatro: maio 1964

Capa Última Hora: Sexta-feira, 8 de maio de 1964
Dia desses encontrei essa capa do jornal Última hora, do começo de maio de 1964. É o registro da prisão de Cleyde Yaconis pelo DOPS e “submetida a severo interrogatório”. Em A Dama Discreta, livro que escrevi sobre ela, Cleyde falou da prisão. Vai em memória de Cleyde em homenagem aos pensamentos tortos que pedem a volta dos militares ao poder. 

“Uma noite, quando saía do espetáculo Vereda da Salvação, tinha cinco carros da polícia na porta do TBC me esperando. Eu saí com o Stênio (Garcia, então marido dela), estava com o meu carro e ele me levou até a porta do DOPS, lá perto da Estação da Luz. “Corre e avisa a Cacilda”, disse para ele. Meia hora depois que eu cheguei no DOPS, começou uma chuva de telefonemas de gente influente que a Cacilda tinha contatado. Parece que eles iam me mandar para não sei onde, mas daí vieram os telefonemas dizendo “não toquem nessa moça”. Em meia hora, a Cacilda pôs São Paulo em pé. Ela era danada, tirou muita gente da cadeia e escondia no apartamento dela, os padres dominicanos, Flavio Império, Guarnieri. Cacilda era intocável.

Não sei porque me prenderam. Parece que encontraram o meu nome e do Flávio Rangel na lista de uma reunião não sei de quem. Nunca tive uma atividade política, como tiveram vários conhecidos meus, de assaltar banco para pegar dinheiro. O que eu tinha feito era absolutamente legal, como assinar abaixo-assinados pró-Fidel Castro na época da Revolução Cubana, ou quando teve a renúncia do presidente Jânio Quadros para que seu vice, o João Goulart, assumisse. Eram todas atitudes democráticas. Todas as minhas atitudes eram de pessoa consciente mas democrática, nada a ver com ação de luta, guerrilha, nada disso. Mas parece que eles encontraram meu nome numa lista com o Flávio, que foi preso várias vezes.
Com Ruth de Souza, Stênio Garcia e Raul Cortez: Vereda da Salvação
Quando cheguei, eles me puseram na cela, a porta não era gradeada, era aquela porta de ferro com aberturinha. A porta abriu e eu vi uma pessoa falando assim “Cleyde, Cleyde você aqui”. Era o físico Mario Schemberg que estava preso lá. E eles tiveram que esvaziar uma cela porque só tinha eu de mulher. Todos os que estavam em duas celas foram colocados em uma só e eu fiquei na outra. Era maio, fazia frio e era cimento, uma laje de cimento. Só que a Cacilda me tirou logo. Foi uma situação pavorosa, mas eu não entrei em pânico, consegui ficar calma.

De autores de esquerda, eu só tinha feito Guarnieri. Jorge Andrade era um homem de esquerda sim, mas não comunista. Do partido comunista eram o Dias Gomes e o Guarnieri. Mas eu tinha uma atitude de esquerda, isso sim, como até hoje, um posicionamento de esquerda, não de direita, claro. Como hoje. Tenho uma atitude de esquerda e contra o abuso do poder, me revolto com a má distribuição de renda, com a fome no Brasil, com a corrupção...Então se tiver uma revolução hoje vão me prender também, porque a minha atitude continua sendo a mesma.”



terça-feira, 28 de julho de 2015

De onde vem sapatão, o termo?


De onde vem o termo sapata/sapatão para designar lésbica? Por anos corri atrás da história, falavam de Maria Sapatão, a marchinha de Carnaval do Chacrinha que fez sucesso no carnaval de 1981. Lendo O Explorador de Emoções Peregrinas, livro delicioso sobre Antonio Bivar escrito por Maria Lucia Dahl, topo com uma história deliciosa, provavalmente ocorrida no final dos nos 60. Eis a origem do termo sapatão, segundo Antonio Bivar. 

"Isabel Câmara me contava da ideia que tinha de fazer uma peça só com moças – usando no título um termo que já estava na boca do pessoal. Dentro do feminismo crescente, as sapatas eram uma nova tribo safista fazendo vista na sociedade. Moças destemidas, independentes, engraçadas, glamurosas, sibaritas, amazonas modernas com o pisar determinado. Daí que Isabel, poeta dessa tribo, nas férias em Petrópolis anotara ideias para uma peça que já tinha até título: Viva Sapatas. 

Foto do livro
Isabel estava animada! 

– Foi a Anecy Rocha, junto com a [Maria] Bethânia que inventaram o termo sapatão. 

Uma olhava pra outra e comentava sobre alguém: 

– Você viu o sapato que ela estava usando?! 

E a outra respondia, rindo: 

– Poxa! Que sapatão, hein! 

Daí começou essa onda de sapata... "

Fonte: Antonio Bivar - O Explorador de Emoções Peregrinas, de Maria Lucia Dahl (Coleção Aplauso)




domingo, 5 de julho de 2015

Quando os bares gays eram uma porta escura em algum lugar de Manhattan

Rooney Mara e Cate Blanchett no filme de Todd Haynes
Soube da existência de Carol, filme de Todd Haynes que passou no último festival de Cannes e ainda inédito aqui, e fui atrás do livro em que se baseia. É Carol (The Price of Salt), o segundo romance de Patricia Highsmith, publicado em 1952 sob o pseudônimo de Claire Morgan. “Trata-se claramente do primeiro livro de prestígio a abordar o lesbianismo com uma certa naturalidade, sob uma atmosfera de suspense que caracteriza todos os trabalhos da autora, mas também com direito a diálogos francos, um humor emotivo e personagens enternecedores”, está na contracapa da edição da L&PM Pocket. É daqueles livros pra se apaixonar, pelas personagens (a jovem Therese e Carol, a dona de casa trintona, suburbana e elegante), pela época em que se passa... Ao final, um pós-escrito que Patricia Highsmith escreveu em 1989, seis anos antes de morrer. É tão esclarecedor que vai abaixo o último parágrafo.


A edição L&PM
Sob pseudônimo
“Minha jovem protagonista, Therese, pode parecer uma violeta retraída no meu livro, mas aquela era a época em que os bares gays eram uma porta escura em algum lugar de Manhattan, e as pessoas que os frequentavam saltavam do metrô uma estação antes, ou uma depois, da estação certa, com medo de desconfiarem que eram homossexuais. O atrativo de The Price of Salt era o seu final feliz para as duas personagens principais, ou pelo menos haveria uma tentativa das duas compartilharem um futuro juntas. Antes desse livro, os homossexuais, masculinos e femininos, nos romances americanos, eram obrigados a pagar pelo seu desvio cortando os pulsos, se afogando em piscinas, ou mudando para a heterossexualidade (assim se afirmava) ou mergulhando – sozinhos, sofridos, rejeitados – em uma depressão dos infernos. Muitas cartas que me chegavam traziam mensagens do tipo, “O seu é o primeiro livro assim com um final feliz! Nós todos não nos suicidamos e muitos estão passando muito bem”. Outras diziam, “Obrigada por você ter escrito uma história assim. É um pouco como a minha própria história...”. E, “tenho dezoito anos e moro numa cidade pequena. Me sinto solitária, porque não posso falar com ninguém...”. Às vezes eu escrevia uma carta sugerindo que o missivista se mudasse para uma cidade maior onde teria a oportunidade de conhecer mais pessoas. Conforme me lembro, havia cartas tanto de homens como de mulheres, o que eu achava um bom auspício para meu livro. Isso acabou sendo verdade. As cartas pingaram durante anos, e mesmo agora chega uma carta, uma ou duas vezes por ano, de algum leitor. Nunca escrevi outro livro como este. Meu livro seguinte foi The Blunderer. Gosto de evitar rótulos. São as editoras americanas que gostam deles.” Patricia Highsmith em 24 de maio de 1989.

quarta-feira, 24 de junho de 2015

Dona crase ganha as redes

Dona crase anda toda boba. Caetano Veloso, via redes sociais, a trouxe ao topo. Dia desses, encontrei esses aforismas sobre a crase escritos por Ferreira Gullar em 1955 (ele tinha 25 anos). Achei curioso, salvei e aqui estão.


Aforismas sobre a crase

Ferreira Gullar

A crase não foi feita para humilhar ninguém.

Maria, mãe do Divino Cordeiro, craseava mal. O Divino Cordeiro, mesmo, não era o que se pode chamar um “bamba da crase”.

Quem semeia crases colhe alexandrinos.

As crases e as insígnias têm a mesma origem.

A boa crase vale ouro.

São Francisco de Assis não ensinou crase aos pássaros. E Zaratustra, que tudo aprendeu com os animais do bosque, veio tomar lições numa Universidade, em Bale.

Crase não enche barriga. Mas quem craseia bem, dorme melhor.

Deus dá crases a quem não tem frases.

O estudo da crase é a metafísica dos tímidos.

Os ditadores não sabem que, em expressões como à bala ou a bala, é indiferente crasear ou não.

A Crase pura é uma deformação perigosa, que rouba à crase sua função social.


Tudo o que pedimos é que nos deixem crasear em paz.

A crase, em si, não é má.


segunda-feira, 15 de junho de 2015

A história das canções: Amélia

Quem conta é Alcatra, ou melhor, Ataulfo Alves (1909 -1969), na revista A Cigarra, em junho de 1945. Ele compôs Amélia em parceria com Mario Lago, no início dos anos 40. 

                      Como nasceu “Amélia”



Sempre me perguntam: - “Como é, seu Alcatra, que você e o Mário Lago fizeram “Amélia”? (Alcatra é o meu apelido no meio musical, muito erradamente, derivado de “Alcatrão”, devido à minha cor).
Por isto, resolvi contar a verdadeira e simples história dessa nossa música. Regressara eu de uma viagem à minha cidade natal, uma bela e sossegada terrinha de Minas Gerais, quando Araci de Almeida me disse:


- “Alcatra, você quer saber de uma coisa? Eu sugeri ao Wilson Batista para fazer um samba baseado na vida de Amélia e ele até agora não fez. Quer fazer?

- Amélia? Que Amélia?

- Aquela que era mulher de verdade...



E contou-me a tristíssima história daquela heróica mulher que trabalhava sem queixa, sem descanso, e sofria ao lado do companheiro. Gostei da ideia e ao lado do Mário Lago, um dos maiores letristas e também pianista de talento, começou a produção. Pronto, veio o período agudo, o da gravação. Não sei porque, ninguém queria a música. Achavam que ela era bonita, que os versos eram interessantes, mas não era carnavalesca. Decidi, eu mesmo, gravá-la. Se fez sucesso, os senhores podem responder melhor. Seu nascimento e seus aparecimento quase foram tão difíceis quanto a história da mulher que sabia ser mulher de verdade.

terça-feira, 2 de junho de 2015

O Gato Velho

É poema da Patricia Highsmith e está em Os Gatos, uma jóia da L&PM pocket. É pra Ava, que morreu bem velha há exato um mês. A foto foi a última dela "em paz com tudo".



Ava: a última foto
O Gato Velho

Nada foi feito para mim,
Não, nem mesmo a lareira,
Pois algumas vezes sinto frio e não há fogo,
E outras vezes, não me deixam ir até ali.
Sombras me entediam, e se acaso são um mistério
É bem sem graça. Meus ta-tataranetos
Brincam insensatos ao meu redor, mas eu agora já sei
Que os forros das coisas são apenas forros,
E que atrás da porta entreaberta
Há outra sala como esta aqui.
Gosto de sentar com meus olhos semicerrados,
Porque já vi de tudo
E minhas memórias são bem mais interessantes.
Estou em paz com tudo.
Até os camundongos podem vir a poucos centimetros,
Sabendo que aposentei nossa antiga guerra.
Apenas meus ta-tataranetos

Me irritam às vezes, puxando meu rabo,
Esbarrando e escorregando por cima de mim.
Dou-lhe uns bons tapas nas orelhas,
E volto para onde deixei meus pensamentos.
Estou em paz com tudo.

quarta-feira, 15 de abril de 2015

"Eu me humanizei": Clarice Lispector em julho de 1969




Entrevista de Clarice Lispector é pra se comemorar. No final de 2011, quinze delas foram reunidas em um livro da série Encontros da editora Azougue (no final, links para a primeira entrevista). Dia desses, num dos meus processos de escavação, encontrei essa abaixo, publicada no jornal Última Hora em julho de 1969, quando ela lançava Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres, livro que começa com vírgula e acaba com dois pontos. É bem interessante.

Sempre em tom maior
Texto de Norma Pereira Rego


- Estou muito menos altiva, muito mais ao alcance das pessoas.
Essa foi a primeira resposta que me deu Clarice Lispector. Logo que entrei na sua sala de visitas vi um pequeno quadro com uma linda mulher. Era ela. Pintada por De Chirico, no tempo em que morava em Roma. Ela ainda tem os mesmos olhos amendoados de forma esquisita e a mesma boca forte. Só as maças do rosto já não são salientes porque o rosto está mais cheio. Tirei da bolsa dois livros para ela autografar.
- O primeiro livro e o último.
Foi o seu comentário. Era uma velha edição portuguesa de Perto do Coração Selvagem e outra novíssima lançada agora pela Sabiá: Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres.
- Achei O Livro dos Prazeres muito mais fácil de ler do que qualquer um dos seus outros sete. Acha que isso tem algum fundamento?
- Tem. Eu me humanizei. O livro é um reflexo.
No livro Laços de Família há um conto que eu choro toda vez que leio. Chama-se Preciosidade. Clarice narra o momento em que uma adolescente áspera, fechada em si mesma, descobre que precisa começar a se suavizar.
- Se aquele seu personagem, aquela menina de quinze anos tivesse hoje quarenta, você acha que ela ainda continuaria se sentindo “feia e preciosa”?
- Não é se sentir, é saber que dentro da gente existe alguma coisa a salvaguardar com muito cuidado porque é muito frágil.

CRIANÇA E CRIADA

- O Livro dos Prazeres foi o último, não pretendo mais escrever.
- Por quê?
- Ora! Porque dói muito.
Ela começou a rabiscar com sete anos, aos quinze publicou seu primeiro romance. Nunca pensou em fazer poesia. Veio do Recife com doze anos de idade. No Rio casou-se com um diplomata e viveu em vários paises. Tem três filhos. Não admite seu estilo influenciado pelo de nenhum escritor.
- Você vê o Lawrence que eu ano não tem nada a ver com o que eu escrevo.
- Nem Katharine Mansfield?
- Não. Ela tem um estilo intimista e valoriza pequenos fatos do cotidiano, não creio que este seja o meu modo de escrever.
Todo escritor brasileiro surgido nos últimos 20 anos leu Clarice Lispector. Alguns foram marcados por ela, outros a copiam tranquilamente. Ela tem mesmo algo de fortemente pessoal em matéria de estilo e se parece com seus livros. É densa, sem sombra de humor, sempre sustentando o tom maior, assim como Lucio Cardoso que era seu amigo.
O bacana é que nunca escamoteou o fato de ser mulher ao fazer suas histórias.
- Claro, eui respeito demais a mulher para tentar escondê-la.
Vestir um vestido de fustão no verão, sair correndo para comprar um maiô novo, bisbilhotar o quarto da empregada são vivências femininas que ela não pensa em esquecer. Quer dizer, com Clarice ficou provado que criança e criada são temas ótimos, depende de quem os tocar.

DOIS PONTOS E VÍRGULA

- Já me disseram que esse não vai ser o meu último livro porque eu o terminei com dois pontos.
- E começou com virgula, não é?
- É, mas começar com vírgula não é gracinha não, eu peguei a mulher no meio da vida, no meio de um pensamento.
- Esse livro foi escrito há muito tempo?
- Não, de um ano para cá.
- Você mexe muito no passado?
- Para escrever, não: invento tudo.
- E no dia a dia?
- No dia a dia eu mexo muito com o passado.

Ela me pediu que a entrevista fosse curta, estava cansada. Lembro agora a última frase de um de seus romances: “De qualquer luta ou cansaço me levantarei forte e bela como um cavalo novo”. Isso foi uma profissão de fé. Clarice, seus leitores esperam mais livros.



A Primeira entrevista de Clarice - Parte 1

A Primeira entrevista de Clarice - Parte 2

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Tereza Terezinha e a força dos nomes

Sim, os nomes carregam uma força. É teoria minha, boba e sem peso como toda teoria, o que não deixa de ter um sabor. Gosto de ir traçando um perfil para os nomes de acordo com as pessoas (reais ou fictícias) que vou conhecendo. Ontem, matutava sobre Tereza, a partir da personagem da Fernanda Montenegro na novela Babilônia. Tereza é nome de mulher forte, decretei e fui listando algumas para fundamentar a afirmação. Daí me veio o diminuitivo: Terezinha é nome de mulher sofrida, volta e meia atropelada pela vida. Exemplos? A Terezinha da canção do Chico Buarque puxa a lista ao lado de uma amiga de adolescência que parecia ter uma nuvem carregada vagando por sobre ela, tantas as tragédias que ia vivendo em tão poucos anos. 

Lembrei dessa divagação em torno de Tereza Terezinha agora de manhã, ainda acordando e com aqueles restos de sonhos e pesadelos que costumam nos acompanhar no despertar para um novo dia. É que se chama Terezinha a mãe de Eduardo, o menino de 10 anos assassinado pela polícia, ontem, no Morro do Alemão. Ontem, fui dormir pensando nela, naquela declaração que jamais esqueceria o rosto do policial que acabou com a vida de seu filho, que foi atrás dele e teve uma arma apontada. Pensei na ficção para amainar a dureza da realidade e me veio Anna Magnani naquele clássico neo realista italiano, correndo desesperada e doida atrás dos tanques da repressão. Terezinha Maria de Jesus, meu coração está contigo, nesta sexta santa, dia em que, na minha meninice, as igrejas cobriam os santos com panos roxos. E eu ficava maravilhado e aterrorizado com aquilo. 

quinta-feira, 12 de março de 2015

Ney de braços abertos para Cazuza

O momento "roubado" do instragram da Sarah Oliveira
Foi momento muito lindo do Calada Noite, o programa de Sarah Oliveira no GNT. O tema é a alta noite e a voz de Vange Leonel ecoa na abertura. Assim, num clima íntimo, Sarah entrevista seus convidados. Ontem foi Ney Matogrosso que conversou com Sarah na casa dele – nada de Ilhas de Caras, apenas um sofá, uma janela aberta para o Rio e só. Em certo momento, Cazuza entra no papo. “É como se ele estivesse olhando”, observa a apresentadora. “Ele quem?”, diz Ney olhando para onde ela apontava. Então, surge Cazuza no canto da tela na capa de uma caixa com seus discos e ao lado, uma foto pb de Ney com os braços abertos, um canto da casa de Ney. “Eu de braços abertos pra ele”, conta Ney, lembrando que nunca tinham feito a associação. Foi momento todo amor que houver nessa vida muito lindo, daqueles raros na televisão. 

terça-feira, 3 de março de 2015

Pra esperar as lésbicas de Fernanda e Nathalia

Nathalia e Fernanda: Babilônia
Lá pelos anos 90, a discussão gay avançou tanto que retrocessos pareciam impensáveis. Não foi assim. Houve a evolução e depois um visível retrocesso. Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg vão interpretar um casal de lésbicas há trinta juntas na novela Babilônia, de Gilberto Braga pras nove da noite. A TV, assim como as artes em geral, tem o papel de moldar a sociedade, do mesmo modo que um ferreiro molda o ferro maciço com a bigorna. É importante debatermos questões que ainda geram preconceito justamente para acabar ele”, disse Fernanda em O Globo.

E aguardando as oitentonas Fernanda e Nathalia, dois bons momentos com atrizes mais velhas interpretando lésbicas.

A primeira é no cinema, em Desejo Proibido (If These Walls Could Talk 2, 2000), telefilme da HBO que mostrava a evolução da questão lésbica em três décadas, três gerações três histórias – quinze anos depois seria interessante uma quarta história, outra geração. A primeira história, nos anos 60, tem Edith e Abby (Vanessa e Redgrave e Marian Sheldes) juntas há 50 anos e enfrentando o desamparo da sociedade quando uma delas morre. É tocante. A produção é de Ellen DeGeneres, uma das vozes mais importantes na questão lésbica e que faz par com Sharon Stone na trama que encerra o filme.

Vanessa e Redgrave e Marian Sheldes: Desejo Proibido
De volta ao Brasil, para Alice, série da HBO. A tia da protagonista, vivida por Regina Braga vive com outra mulher (Denise Weinberg). E a cena de casamento das duas, ao som de Sangue Latino, é dos grandes momentos da diversidade na televisão.

Regina Braga e Denise Weinberg: Alice

domingo, 1 de março de 2015

O começo do fim da rua Moacir Pizza

Havia uma rua bucólica encravada nos Jardins, apenas um quarteirão ligando as alamedas Jaú e a Itu, a Moacir Pizza. Um prédio na esquina da Jaú, outro na da Itu e várias casas geminadas – residências, ateliers, cabeleireiros. Era uma espécie de fotografia no século 21 do que o bairro foi antes de ser tomado pelos prédios.

Rua Moacir Pizza, vítima do "reinventando a cidade" da Vitacon
Tem um “havia” lá no começo, né. Então, um belo dia chega a Vitacon “Reinventando a cidade” e lança suas garras sobre aquele bucolismo que não rende grana.


Primeiro a construtora comprou um estacionamento na Bela Cintra (paralela a Moacir Pizza) e depois um casarão que abrigava o restaurante Folha de Uva. Não satisfeitos com o espaço de dois terrenos na Bela Cintra, miraram na rua de trás, a interiorana Moacir Pizza – duas casas e um prédio de 3 andares. A proprietária da primeira casa a ser contatada até tentou resistir, mas aí começaram a ocorrer coisas estranhas: os quatro pneus do carro dela foram furados e houve mais, muito mais. A demolição das casas adquiridas pela Vitacon já começou. 

A primeira das três casas já está sendo demolida
Moacir Pizza, a rua, continua, mas sem o bucolismo e começa a fazer parte de um passado na cidade que parece odiar olhar para o seu passado. E toda a vez que leio o “Reinventando a cidade” (no site é “reinvente a cidade”), slogan da construtora, tenho ganas de... melhor deixar pra lá. 

PS: As construtoras não param e essa não é a única construção na região. Na esquina da Itu com a Bela Cintra, já está subindo um prédio imenso, no lugar de um casario. Aqui o link http://viledesm.blogspot.com/2015/02/o-casario-que-cidade-comeu.html 




terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

O casario que a cidade comeu

Havia um casario antigo ali bem na esquina da alameda Itu com a Bela Cintra. A demolição começou quase no final de 2013 (foto mais abaixo). Passando por ali hoje vi o esqueleto do futuro prédio e o andar térreo já erguido. Tudo mudado, apenas o poste e os fios são os mesmos, as arvorezinhas mirradas também. ~~ A cidade não para, a cidade só cresce ~~ É, até o dia em que ela for parada. 

Alameda Itu com Bela Cintra, 3 de fevereiro 2015
Alameda Itu com Bela Cintra há 14 meses


Um perfil escrito por Antônio Maria para celebrar o dia dos 110 anos de Aracy de Almeida

19 de agosto: o dia que seria o dos 110 anos de Aracy de Almeida. E Aracy é uma paixão: as canções, o jeitão, as tiradas, as histórias. Esse...