terça-feira, 11 de abril de 2017

Carolaine no fio da calçada

Quase fim da tarde. Numa Paulista aberta carnavalizada, topo com Carolaine. Toda de preto, blusa decotada, sutiã roxo aparecendo. Tem algo de Madonna lá nos primeiros tempos, uma Madonna das ruas. Está pedindo moedas, fugindo dos seguranças que a enxotam sem dó. Eu, de óculos escuros, sentado no fio da calçada. Ela me olha, dou um sorriso e a danada coloca os óculos que estavam equilibrando nos cabelos tingidos. "É pra ficar igual a você, vou tapar os olhos", fala arrematando com um "a loka". “E olhos lindos”, respondo. Cinzentos, vivos, sob sobrancelhas pintadas. Caroline abre um sorrisão, diz um monte de obrigada obrigada e senta ao meu lado. Amiga instantânea.

Em minutos, ela me conta que foi clubber quando menino, que agitou muito na noite e que há sete vive nas ruas, desde que expulsa de casa pela mãe. Tem 27. Aos 13 frequentava o Atari, Bocage e outros endereços da noite gay paulistana do início do século. Fala que queria ficar cheirosa e me pede pra comprar pasta de dente, desodorante e sabonete. "Não precisa ser caro. Tudo de menina", diz meio rindo e fazendo charme. Não quer ir comigo à farmácia. Compro as encomendas de Caroline e, na volta, não a encontro no fio da calçada. Espero um pouco e dou uma circulada - está sentada, apoiada numa lixeira. Abre um sorrisão quando vê o pacote e mais ainda quando digo que tem um chocolate também. Ganho um abraço bem apertado e fico ali, vendo Caroline se afastando na avenida cheia de gente fantasiada e, toda toda, segurando a sacola de plástico que vai lhe perfumar a existência.  É, Carolaine, como já disse alguém, “ a vida é assim...dura”.

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