quinta-feira, 11 de julho de 2013

Dois velhos de passeata




Estavam os dois velhos ali, numa passeata na Paulista, hoje à tarde. No mesmo espaço, separados fisicamente por alguns metros. Mas só fisicamente. Em volta, uma multidão, bandeiras e mais bandeiras, causas e mais casas sociais. E entre os dois, um abismo, o da história desse País. O velho do MST me chamou atenção pela animação, pelo jeito de marchar como se sambasse desajeitado mas cheio de charme. Vi de longe, passou por mim e corri para fotografá-lo entre os companheiros do movimento – atrás estava um casal jovem, a moça sem uma perna. Havia um fogo no cu ali – é bom explicar, pra mim fogo no cu é alegria de viver. O homem velho desfilava feliz com sua bandeira vermelha de uma causa demonizada há anos pelos meios de comunicação. Exagero meu? Então repare no modo com que os apresentadores dos jornais nacionais da vida pronunciam a palavra MST como se palavrão cabeludo fosse.


Acompanhei com o olhar o velho do MST até ele sumir no meio do povo e segui caminhando no sentido contrário da marcha. Logo surgiu o outro, o velho ditadura. Ele andava sozinho com aquele cartaz de sandices. Ninguém dava a menor para ele – tá alguns risinhos de repulsa – era como se não existisse, numa solidão absurda no meio de um povo que treme só de ouvir falar a tal ditadura que ele enaltece. No velho ditadura não havia fogo no cu, só uma certa tristeza, um ressentimento, um cinismo, um estar de mal com o viver nítido mesmo com os óculos escuros. Era como se como o cartaz ele lamentasse a ditadura não ter acabado com o velho MST. Voltei para fotografá-lo de longe e de frente e quando se sentiu diante da câmara, o velho ditadura deu uma paradinha pra posar pra foto. Patético. Estavam os dois ali na avenida, a poucos metros, e tão distantes. O de mal com a vida do velho ditadura vou esquecer logo, mas a postura de vida do velho MST fica comigo. Tem que ficar.

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