terça-feira, 9 de julho de 2013

Hilda Hilst e Marlon Brando: Meia Noite em Paris


Hilda: Biarritz, 1957. Foto do Cadernos de literatura do IMS
“Organizei um livro em forma de entrevistas, pretensiosas. Conto dos entrevistados, enquanto conto de mim”: é assim que Rita Ruschel auto-apresenta seu Meus Tesouros de Juventude. Editado em 1983, volta e meia o retiro da estante e releio uma das “entrevistas, pretensiosas”. Tem Elis Regina, Tom Jobim, Toquinho, Lima Barreto, o pai dela Alberto Ruschel e muitos outros que, como diz o título, ela conheceu quando jovem. Hoje, fui direto a Hilda Hilst: “Eu a conheço desde pequena. Conheço é força de expressão. Foi o tipo inesquecível da minha infância”. São onze páginas que se lê com a sensação de estar andando com as duas mulheres pelo sítio de Hilda em Campinas, quando a escritora tinha 50 anos: “Estávamos caminhando pelo jardim, indo em direção à figueira centenária. (...) Sentamos embaixo da árvore, na mesa e nos bancos de pedra. Começava a ventar, jeito de tempestade”.

Marlon Brando e Irwin Shaw: Paris, 1957. Foto site Irwin Shaw
A vontade é de copiar o perfil inteiro. Ainda mais depois que o googleio revelou que não está na rede. Nada. Vou é copiar um parágrafo extenso, que reúne Hilda, Marlon Brando, Dean Martin, Hotel Ritz, Paris. É como se fosse uma das tramas do Meia Noite em Paris, do Woody Allen. Acontece em 1957, quando Hilda viajou pela Europa, de junho a dezembro. E Brando esteve por lá nesse ano filmando Os Deuses Vencidos (The Young Lions), baseado em livro de Irwin Shaw (olha os dois na foto ao lado, em 1957) em que interpretou um oficial nazista. Abaixo, o relato de Rita Ruschel.

“Numa noite daquelas antigas, eu escutei Hilda e a minha mãe conversando meio de surdina. Fecharam a porta da sala e eu, do meu quarto, pude entreouvir uma referência a Marlon Brando. Elas estavam falando do meu ídolo cinematográfico, o gênio das telas. Como se tratava de uma pessoa muito importante para mim, deixei por isso mesmo, guardei as coisas assim dentro de mim. Quando fui entrevistá-la vinte anos mais tarde cheia de dedos, resolvi esclarecer a minha fantasia. Foi assim. Hilda estava em Paris namorando Dean Martin, rapidamente. Jantaram com Tony Curtis e ela escapou para o Hotel Ritz. Sabia que naquela noite chegava Marlon Brando. Debaixo de uns martinis seguiu para lá. Trajando na ocasião um vestido longo bordado e uma tiara na cabeça, enfeitando de brilhantes o seu cabelo louro. O gerente avisou que Monsieur Brando não poderia recebê-la. Ele sairia muito cedo para filmar na manhã seguinte. Como ela passou alguns francos por baixo do balcão, o francês, gentilmente, indicou o caminho. Bateu na porta do apartamento, insistiu e ninguém abriu. Achou estranho. Nisso um ator francês saiu do apartamento em atitude suspeita, avisando que o ator não estava hospedado lá. Depois que ele foi embora, Hilda insistiu até que Marlon Brando abrisse. Estava de foulard e chambre de seda. Ela, desapontada, achou que ele era muito baixinho, não sabe se por estar de salto muito alto ou se pelos martinis que tinha tomado. Ao cumprimentá-lo a tiara escapou de sua cabeça e ela foi obrigada a ajeitá-la, sem graça. Como não foi convidada a entrar, na soleira da porta, foi avisando que tinha vindo do Brasil apenas para entrevistá-lo. Ele estranhou o adiantado da hora, mas ela foi convincente. À queima-roupa perguntou “O que você acha de Franz Kafka?” Ele, estarrecido com o nível, respondeu “Quero que se lixe o Kafka e a família dele inteira!” Hilda desancada teve que recompor a tiara mais uma vez. Engatou uma primeira e prosseguiu “Senhor Brando eu vim de longe para saber isso, os jornalistas só lhe fazem perguntas banais.” Ele, vendo aonde ela queria chegar, disse que daria uma entrevista bastante extensa noutra noite, porque realmente teria que estar de pé muito cedo no dia seguinte. “We´ll keep on touch”. 

Um comentário:

Paula Skromov disse...

Vilmar, que maravilha! Eu adoro a Hilda, que mulher cheia de capacidade de se divertir e de levar a sério o que se deve mesmo, fala mais do namoro dela com o Dean, hahaha, não aguento!!

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